Rema a rima rimador





Poeminha sem rima

Desço Os Aflitos aflito...
Bem antes do sol se ir,
Fiz um poema p’ra lua
Que só apareceu na noite.


            Hoje vou falar da rima. Rimar na prosa é em geral defeito estilístico. No verso a rima tem função melódico-harmônica e mnemônica. Como não cheguei ainda a tratar da melodia, tampouco da harmonia do verso, tratarei a rima como noção intuitiva. Só chegarei rasteiramente às noções didáticas. O blog segue essa sequência de oficina p’ra iniciantes, e caso não morra, chegarei aos devidos aprofundamentos dos temas. Assim, para melhor compreensão, o leitor deve sempre retornar a postagens anteriores.
            Feito o preâmbulo prosseguiremos.
            “Rima é a uniformidade do som na terminação de dois ou mais versos” disse o mestre Bilac em seu tratado. No mesmo, o mestre diz que “os árabes da Espanha transmitiram o uso da rima aos trovadores de França; mas, antes disso, já ela tinha sido usada pelos poetas francos” em seus poemas e hinos religiosos. Antes da idade média encontramos seu uso na Ásia, África e América, na antiguidade européia o uso era restrito, quase por acidente.
            Feito esse pequeno resumo histórico vamos ao que interessa.
           
            Falam da rima perfeita,
            Também falam rima pobre
            P'ro poeta que não nobre
            Rimando a rima imperfeita,
            A rima fica sujeita
            Ao seu preço de valor,
            Se paga ao compositor
            Pelo preço sua rima,
            P'ra se fazer obra prima
            Rema a rima rimador.
           
            Podemos classificar a rima de várias maneiras. Acho melhor, para o objetivo dessa postagem, classificá-las em consoantes e toantes. A rima consoante, como na décima que escrevi de improviso acima, o som está em seus conformes, desde a vogal ou ditongo do acento final até a última letra do verso. A rima toante acontece quando as vogais se aproximam sonoramente, como nesse exemplo que faço agora:

            Faço rima toante...
            A música assim ande,
            Andamento traquilo
            P'ro moleque traquino
            Que gosta de samba
            E de dançar ciranda.


            Na literatura de cordel, na nossa poesia popular tradicional, encontramos o emprego das rimas consoantes. Na música popular brasileira contemporânea, no ritmo e poesia popular norte-americana, encontramos o emprego das toantes ao lado das consoantes. Quem quiser ver o emprego das consoantes sugiro os poetas do romantismo e os cordelistas, para as toantes a obra de Cecília Meireles e de João Cabral de Melo Neto são exemplos bons de emprego das mesmas.
            A importância da rima deduz do seu conceito: ao momento que ouvimos um som semelhante ao outro já ouvido, a atenção se volta ao som anterior, lembramos assim o som que ouvimos antes. Como existem formas fixas de disposição das rimas, o movimento contrário também é importante: esperamos escutar o som semelhante no próximo verso onde recairá a próxima rima já predisposta na estrutura da estrofe. É o que acontece na poesia popular e no repente.
            Temos diversas formas de dispor as rimas na estrofe, mas em resumo três são as principais:

            Cruzadas ou entrelaçadas como nessa trova popular:

            Não quero de brincadeira
            Dizer adeus a ninguém
            Quem parte leva saudade
            Quem fica sofre também.

            Em parelha como no exemplo que penso agora:

            Sem ter um vintém
            Não pego seu trem,
            Só tenho ideal
            Que seja real,
            Mas, tendo um amor,
            Eu peço um favor,
            Pois sendo poeta
            Tenho amor por meta.

            E as misturadas, exemplo que tiro de Olavo Bilac:

            De uma eu sei, entretanto
            Que cheguei a estimar,
            Por ser tão desgraçada!
            Tive-a hospedada a um canto
            Do pequeno jardim,
            Era toda riscada
            De um trago cor de mar
            E um traço carmesim.

            Claro que essas combinações fundamentais podem ser distribuídas de outras maneiras. Posteriormente trataremos das várias formas de se fazer cordel, concluindo de bom grado o estudo básico sobre a rima.
            Nas minhas oficinas aplico dinâmicas próprias para o aprendizado das rimas. Espero que tenha contribuído um pouco para os interessados no assunto, mesmo que a prática seja melhor que a teoria.
            ...Esses dias estou mais para fazer versos do que falar sobre eles.
            Como sempre voltarei ao tema quando me der na telha.
            Até.







Bibliografia:


BILAC, Olavo e PASSOS, Guimarães. Tratado de Versificação, Rio de Janeiro, 1905, Editoração Eletrônica: Nunes, Ana Luiza e Abelaira, Paulo Mendes.




CAMARGO REGIS, Maria Helena. Manual de Comunicação Poética, 1982, Santa Catarina, Ed. da UFSC / Ed. Lunardelli.


PIGNATARI, Décio. Comunicação Poética, São Paulo, 4º Edição, Editora Moraes. 

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