A Consciência Negra em Cordel na Escola
Jefferson Hora, eu e Juan Gomes. |
Participei
como elaborador duma prova e Júri da 15ª Gincana do Colégio Estadual Elisabeth Chaves Veloso, localizado
no Cabula VI, no qual desenvolvo como arte-educador, desde o ano passado, um
projeto de produção de textos em versos e prosas. Agradeço a direção e a todos
os alunos e profissionais pela liberdade que tenho nas minhas ações educativas.
Publicarei em outra oportunidade uma síntese dos resultados deste ano. Por
agora fico com os dois mocinhos que realizaram a prova “Escrever um livreto de
cordel e publica-lo no seu formato tradicional sobre o tema “O Quilombo do
Cabula e o Negro Beiru”.
Eram quatro as equipes e além
dos mocinhos, outras duas mocinhas também realizaram muito bem a prova. Mas a
história desses dois é digna de nota. É que Jefferson Hora, o de cabelo Black na foto, perdeu seu texto um dia
antes da apresentação. O cordel dele estava lindo, todos comentavam que tinha
feito um verdadeiro poema, que era a poesia. De fato o menino é mesmo estiloso. Aí aquelas coisas que não
acontecem mais. Juan Gomes, seu concorrente de boné na foto, também bom rimador,
que me confessou não ter fixado muito bem o ritmo do cordel, vendo o colega
desesperado o ajudou.
Daí saiu o
cordel de maior pontuação entre as equipes. De Jefferson da Hora com a colaboração de Juan Gomes "O Quilombo do Cabula e o Negro Beiru", vamos a uma curta análise dele.
Feito em dezesseis estrofes septilhas,
ou sete pés ou versos, com rimas em xaxabba (onde x não rima), versos em
redondilha maior, um ou outro quebrado, começa a falar sobre a origem do bairro
e na terceira estrofe diz:
“Da dança se veio o nome
É do negro, se especula
Veio do Congo e Angola
Povo que não se rotula
Deu origem ao povoado
Êta que povo arretado
Que formaram o Cabula”.
Prossegue com as origens do
bairro. Palavras em quimbundo e iorubá precisas e naturalmente colocadas, as quais valorizam ainda mais o texto. Fala da posterior
chegada dos povos nagôs e sobre a figura do Negro Beiru, onde faz tal reflexão:
“Pois pouca gente se importa
Com esse tempo de outrora
A luta não reconhece
O importante é só o agora
São feitos de incoerência
E não conhecem a essência
Nem do lugar onde Mora”.
Depois de fazer uma ponte
histórica com o tempo atual, arrebata:
Já quem sofreu de verdade
Fica quase que excluído
Pergunta quem foi Zumbi
E o que se ouve é zumbido
Com Beirú da mesma forma
Só que sua essência é norma
Cada verso aqui trazido.
Com uma ótima pesquisa de base
histórica. Um exemplar da consciência negra.
Conclui seu lindo cordel numa perspectiva utópica que só a juventude tem:
“Se parar pra perceber
É um caso por segundo
Negro aqui tem história
Que fez o Brasil fecundo
Do Bonfim tem o Senhor
Do Brasil tem Salvador
Maior Quilombo do mundo”.
Depois da leitura de Jefferson,
uma linda mocinha do sexto ano, afirma sua negritude, e com um violino (foi minha
aluna e fiquei surpreso ao vê-la tocar) executa um tema em Baião. Aí não aguentei e fiquei emocionado.
Essa é nossa escola pública,
onde projetos realizados com amor dão resultados apaixonantes. Agradeço aos
dois mocinhos e a todas as equipes da Gincana por reiterar minha crença na humanidade.
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