As origens do nosso verso popular

          I


          Em outros dois pequenos ensaios postados aqui falei do trovador. Um pouco da matriz portuguesa, já largamente difundida, como da matriz africana, que por muito tem sido desprezada. A nossa literatura popular em verso sofreu a confluência da cultura negra (com seus cantadores) e indígena (no seu contato com os jesuítas), logo, sua formação e evolução difere daquela vinda dos trovadores da península ibérica, esses mesmos influenciados pela cultura árabe-negra em suas origens.

          Vamos por tempo tratar do tipo europeu.

          Num belo e erudito ensaio “Trovadores – tipos e condições” do mestre vanguardista Ezra Pound, que nos servirá como primeiro guia, ele diz que “A fortuna dos trovadores variava tanto quanto sua categoria, e eles provinham de todas as classes sociais”. Trovaram reis, monges, alfaiates, nobres e pobres cavaleiros num estilo por assim popular em sua natureza. Da importância da trova provençal diz o mestre:

“É verdade que, após a Renascença, cada século procurou, à sua maneira, aproximar-se do clássico; contudo, para compreender a arte do verso – essa parte de nossa civilização –, devemos começar pelas raízes, e essas raízes são medievais. A arte poética da Provença preparou o caminho para a arte poética da Toscana; e é o que prova Dante sobejamente em De Vulgari Eloquio. O legado da arte é uma coisa para o público, e outra muito diferente para os artistas que virão a seguir. A herança que um artista recebe de outros artistas pode ser pouco mais que certos entusiasmos, os quais geralmente lhe estragam a primeira obra; e um conhecimento definido dos modos de expressão, conhecimento que contribui para aperfeiçoar lhe as realizações mais amadurecidas. É uma questão de técnica”.

          As trovas eram cantadas ou recitadas acompanhadas de viola ou alaúde, tanto nas tabernas e prostíbulos como nos palácios e mosteiros. Não pensem que só de amor falava os trovadores, a escola da sátira e da crítica social popular daí também deve sua origem. Nesta aprendemos que em todas as épocas os “barões faziam guerra em busca do lucro, sem pensar nos camponeses”. Quando o séc. XII deu por fim, e com ele suas trovas, é a escola da sátira ( não sei ao certo o autor) que nos diz:

“Jamais tornaremos a ver Páscoas tão lindas
Como as de outrora, prazerosas, com canções
Não! as de hoje trazem alarmas e incursões
Vêm ornadas de guerra, tristezas e terrores,
Vêm ornadas de tropas e tropéis,
Sim, belo espetáculo é ver amo e pastor
Infelizes, seguindo sem saber aonde vão.”

Continuaremos da região de Provença para a Galícia, em outra postagem.

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