DÉCIMAS

DO TODO DA PARTE PRIVADA

                                      O todo sem a parte não é todo,
                                      A parte sem o todo não é parte...

                                                                     Gregório de Matos Guerra

De réis em réis fez-se trono,
De trono em trono fez rei,
Do alto pro baixo fez lei,
De lei a lei vem abandono,
Pra cada qual o seu dono,
Pra cada dono seu mundo,
Pra todo mundo no fundo
Ser doutro uma parte estranha,
Com seu quantum que barganha
Pequeno mundo fecundo.

Privadas partes componha
Ser privado toda parte,
Tudo que pra mais destarte,
Privado até do que sonha,
Com a parte que lhe imponha,
Dada como parte dor
( É que dor tem seu valor)
É repartido o homem todo,
De lodo, a engodo, a mais lodo,
De despeito a desamor.

Sagrada a parte privada
Profano vive seu homem,
Privados da ceia que comem,
Privados na teia forjada
Duma força tão danada,
Causa mãe de todo dano,
Entra é homem pelo cano,
Entope, rasga e lasca,
E na santa ninguém tasca
De tal variado arcano.


Demais que seja barroco,
Demais natural rebojo,
Por toda parte dá nojo,
Tanto discurso de rouco,
Tanto santo de pau oco
Que diz estar perdoado,
Menor ou maior Estado,
Parte por parte se inunda,
Todo por todo se imunda
Parte do todo privado.


Obs.: Essas décimas datam de 2003, foi publicado pela primeira vez no jornal literário " SOPA POESIA" em 2004. Como quase nada mudou e achei o momento propício, resolvi postá- lo depois de tanto tempo.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Consciência Negra em Cordel na Escola

A Literatura de Cordel e a Influência Africana

Destrinchando a História da Donzela Teodora* - Um Clássico da Literatura de Cordel